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Paper Report – II Fórum Melhor Jornada do Paciente com Doença Inflamatória Intestinal

A JORNADA DO PACIENTE COM DOENÇA INFLAMATÓRIA INTESTINAL

Paper report produzido a partir do II Fórum Melhor Jornada do Paciente com Doença Inflamatória Intestinal (DII)

No dia 3 de julho de 2024, a Educare realizou o II Fórum Melhor Jornada do Paciente com Doença Inflamatória Intestinal (DII), visando promover conexões através da educação e capacitar a cadeia assistencial para ampliar o acesso. O evento ocorreu no Café Coworking Tecnopuc, na PUCRS — Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre.

Entre os mais de 55 convidados, diretamente envolvidos na cadeia assistencial, estavam especialistas médicos, equipe multidisciplinar e gestores dos principais centros de referência para o diagnóstico e tratamento da doença no estado, apoiadores, gestores de operadoras de saúde como IPE Saúde, Unimed POA, Unimed Cachoeira do Sul, Cassi, COSEMS/RS (Conselho de Secretarias Municipais de Saúde do Rio Grande do Sul), SES RS (Secretaria da Saúde do Rio Grande do Sul), SIMERS (Sindicato Médico do Rio Grande do Sul), clínicas de infusão e representantes do GEDIIB (Grupo de Estudos da Doença Inflamatória Intestinal do Brasil) e AGADII (Associação Gaúcha de Doenças Inflamatórias Intestinais).

Os convidados puderam ouvir e debater com a Dra. Cristina Flores, médica gastroenterologista, membro titular da Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva – SOBED, diretora técnica do Centro de Doenças Intestinais Inflamatórias e Imunomediadas (DIImuno), membro fundadora e presidente do GEDIIB; a Dra. Marta Machado, médica gastroenterologista, professora de gastroenterologia da PUCRS, médica endoscopista e coordenadora do ambulatório de Doenças Inflamatórias Intestinais do Hospital São Lucas da PUCRS, presidente da Associação Brasileira de Colite e Doença de Crohn (ABCD) e sócia fundadora do GEDIIB; o Dr. Richard Magalhães, membro Titular do Grupo de Doenças Intestinais Inflamatórias do Brasil (GEDIIB), membro Titular da Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva, preceptor do Núcleo de Doenças Intestinais Inflamatórias da Santa Casa de Porto Alegre, diretor Clínico do Centro de Doenças Intestinais Inflamatórias e Imunomediadas (DIImuno); o Gustavo Machado, Founder e CEO da Educare Brasil, diretor do Grupo THM e diretor associado da Associação Gaúcha das Clínicas de Terapia Assistida; e, o Diego Espíndola, biólogo, músico, pós em gestão hospitalar, mais de uma década como secretário de saúde, e atualmente é Diretor Executivo do COSEMS/RS (Conselho de Secretarias Municipais de Saúde do Rio Grande do Sul).

SOBRE A DOENÇA INFLAMATÓRIA INTESTINAL

A doença inflamatória intestinal possui diversas nuances. São doenças heterogêneas representadas principalmente pela retocolite e doença de Crohn. O quadro clínico, quando não tratado precoce e adequadamente, por ser progressivo e irreversível, gera incapacidade. Sendo alto o índice de internações e cirurgias, bem como o custo hospitalar.

A DII é mais comum em pessoas entre 15 e 35 anos, ou seja, pacientes jovens, até mesmo adolescentes, no auge de sua idade produtiva. Por esta razão, observa-se que o impacto da doença inflamatória intestinal é potencializado, especialmente devido ao grande número de casos graves.

Pacientes que sofrem de doença inflamatória intestinal precisam, com frequência, afastar-se do trabalho por motivo de incapacidade, necessitando utilizar o benefício por incapacidade temporária do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Portanto, o impacto gerado por essa doença não atinge somente a vida pessoal dos pacientes, mas também a sociedade como um todo.

COMO SE DEU A EVOLUÇÃO DOS TRATAMENTOS PARA DOENÇAS INFLAMATÓRIAS INTESTINAIS?

Até 1995, era muito difícil o combate às doenças inflamatórias intestinais. Foi apenas a partir do descobrimento do medicamento infliximabe que o cenário começou a mudar. Este fármaco trouxe resultados muito mais satisfatórios aos tratamentos, podendo chegar, inclusive, à cicatrização completa do intestino e à recuperação da qualidade de vida dos pacientes.

Dali em diante, novos medicamentos surgiram rapidamente, o que foi motivo de celebração, por haver novas opções de tratamento, mas também causou preocupação, com o impacto orçamentário e econômico, revisitando a necessidade do uso racional dos tratamentos disponíveis, tendo em vista o aumento progressivo da incidência de doenças inflamatórias intestinais na população.

É importante observar também que nem todos os pacientes têm acesso imediato a um centro de tratamento especializado, com profissionais especializados e medicações adequadas. Pela ausência de tratamento correto em tempo hábil, alguns pacientes chegam ao centro especializado somente quando já apresentam um quadro grave, com complicações como fístulas e estenose, quando se deve realizar cirurgia. Esta situação não apenas gera custos maiores ao sistema de saúde, como também impacta significativamente a qualidade de vida do paciente.

Para a Dra. Cristina, “nós vemos como foi começando a acelerar o surgimento de novas medicações, e isto, ao mesmo tempo, em que nós celebramos porque temos mais opções de tratamento, sabemos que tem um impacto econômico orçamentário que nós não podemos fechar os olhos para isso. Nós precisamos pensar na forma mais inteligente de concretizar a chegada da medicação adequada para cada paciente, mas de uma forma racional.”.

A Dra. apresenta um estudo do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS) que demonstra que, em 2022 e 2023, os maiores gastos das operadoras de planos de saúde foram com internações para tratamento das doenças inflamatórias intestinais. Enquanto os medicamentos representam 13% dos gastos, sendo que apenas 3% são de fato com as terapias biológicas (IESS, 2024). 

O dinheiro é um só, mas podemos utilizá-lo de forma mais inteligente em prol dos pacientes, e, mesmo que não se faça economia, com certeza melhoraremos a vida desses pacientes, alocando o dinheiro de uma forma melhor.

QUAL O CENÁRIO DAS DOENÇAS INFLAMATÓRIAS INTESTINAIS NO ÂMBITO DO SUS?

Um estudo demonstrou que, entre 2012 e 2020, foram liberados medicamentos para o tratamento de cerca de 212 mil pacientes com retocolite ou doença de Crohn na rede pública de saúde. Sendo o sul e o sudeste as regiões com maior incidência (Quaresma et al., 2024).

O PCDT (Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas) do Ministério da Saúde estabelece critérios para o diagnóstico da doença, define o tratamento ideal e determina mecanismos de controle clínico a serem seguidos pelos profissionais da saúde no Brasil (Brasil, 2024).

Todavia, observa-se falha na educação médica que dificulta o diagnóstico precoce da doença inflamatória intestinal. Isto pode ser evidenciado pelos pacientes que costumam percorrer diversos serviços de saúde, inclusive em busca de atendimento de emergência, e realizam diversos exames — muitas vezes desnecessários — até receber o diagnóstico adequado. Em média, um diagnóstico preciso demora de 1 a 2 anos.

Mesmo com o diagnóstico correto e o tratamento prescrito, o paciente pode ter que esperar até 8 meses, desde a solicitação perante a Secretaria de Saúde, até receber o medicamento de que necessita. Nas palavras da Dra. Marta “90% dos pacientes têm sua qualidade de vida destruída por essa doença, não bem tratada, não bem diagnosticada, e realmente o comprometimento é sistêmico, além do intestino, é depressão, fatiga, manifestação extra-intestinal, perda de peso, perda de faculdade, e perda da vida em idades jovens”. 

QUAIS AS FERRAMENTAS DISPONÍVEIS HOJE PARA DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DA DOENÇA INFLAMATÓRIA INTESTINAL?

Do ponto de vista laboratorial, utiliza-se diariamente os exames de Proteína C Reativa (PCR) e a Calprotectina fecal, a fim de avaliar a inflamação. O primeiro através da coleta de sangue, e o segundo por meio de análise das fezes. Entretanto, não são exames específicos, pois podem sofrer alterações devido a condições de gastroenterite aguda, infecções intestinais ou infecções dos seios paranasais.

Também utiliza-se da Dosagem de Níveis Séricos, para dosar o nível de infliximabe ou adalimumabe no sangue, que são as principais moléculas, e assim definir se há presença de anticorpos contra esses medicamentos, o que é de grande relevância para a decisão terapêutica quando o paciente perde resposta ao tratamento.

A endoscopia digestiva é uma ferramenta extremamente importante, que avalia, através da ileocolonoscopia, toda a região do cólon e da porção final do intestino delgado. Enquanto que, por meio da endoscopia digestiva, se é capaz de avaliar até a primeira porção do intestino. Os exames endoscópicos apresentam hoje imagens altamente fidedignas das lesões, podendo-se utilizar ainda da cromoscopia digital para avaliar e diferenciar áreas de neoplasia ou displasia, cápsulas endoscópicas, e enteroscopia de duplo balão.

Para avaliação do intestino delgado utiliza-se, primordialmente, a enterotomografia e a enterorressonância magnética com contraste endovenoso, permitindo assim o escurecimento do lúmen na mucosa intestinal, bem como a cine-ressonância, o vídeo-laudo emitido por médico radiologista, e o ultrassom intestinal. 

O desenvolvimento dos medicamentos imunobiológicos ampliou, e continua ampliando as opções terapêuticas disponíveis para as doenças inflamatórias intestinais, que antes eram de difícil tratamento. Hoje, as diversas alternativas existentes beneficiam os pacientes.

Para isso, diante da dificuldade do maneja dessas doenças, é necessário também haver o trabalho de uma equipe multidisciplinar, composta por profissionais da enfermagem, psicologia, assistência social e médicos de diversas especialidades como coloproctologia, reumatologia e dermatologia, por se tratar de uma doença sistêmica.

Segundo o Dr. Richard, “a doença intestinal inflamatória não é uma doença restrita ao aparelho digestivo, temos que entender isso pois pode ter repercussão em diversos sistemas com repercussões clínicas e de qualidade de vida nos pacientes muito significativa, por isso também a importância de uma equipe multidisciplinar”. 

O QUE PODEMOS ESPERAR DAQUI PARA FRENTE EM TERMOS DE NOVAS TECNOLOGIAS?

Os exames de biomarcadores que vêm sendo desenvolvidos visam possibilitar o entendimento das diferentes respostas e efeitos adversos apresentados pelos pacientes quando da utilização de medicamentos. Essa tecnologia envolve assinaturas transcriptômicas (de RNA mensageiro) e, em outra área de pesquisa, organizações celulares observadas em peças cirúrgicas. 

Os desafios da pesquisa de novas tecnologias em doença intestinal inflamatória incluem a necessidade de melhorar a detecção da inflamação, através de exames de TC e RM multiparamétrica, tomografia optoacústica e ultrassom molecular. Os biossensores, por sua vez, se prestam a monitorar os efeitos do tratamento e a perda de resposta com informações precoces.

Outras áreas de pesquisa dedicam-se ao estudo de como prevenir complicações operatórias, e como avançar na liberação de medicamentos para doenças pouco responsivas. As vantagens oferecidas pelos biossensores são a detecção precoce da inflamação, permitindo ajustes na terapia; o monitoramento contínuo em tempo real, em comunicação com dispositivos móveis; a redução da necessidade de visitas a centros de saúde; e a personalização do tratamento. Independente das inovações, é sempre necessário uma equipe multidisciplinar, em sintonia com uma linha de cuidado, e uma boa comunicação com o paciente.

COMO É POSSÍVEL MELHORAR A JORNADA DOS PACIENTES COM DOENÇA INFLAMATÓRIA INTESTINAL?

Há localidades, principalmente nas regiões interioranas, em que não existem profissionais nem centros de tratamentos especializados aptos a lidar com as doenças inflamatórias intestinais. Nestes cenários, é extremamente útil as ferramentas de telemedicina, inclusive a telessaúde nas próprias Unidades Básicas de Saúde, para que os profissionais da atenção básica possam ser capacitados e orientados quando necessário, por meio de teleconsultas. Para a implementação dessas estratégias, é preciso haver um esforço e trabalho em conjunto entre os profissionais da saúde e os gestores públicos.

Para Diego (Diretor do COSEMS/RS) “nós temos um grande problema no nosso sistema público brasileiro que é a burocracia (…) todo dia tem uma portaria nova, uma nota técnica nova, uma nomenclatura nova, todo dia tem que estar se atualizando, e acaba que a gente não consegue chegar nesse volume de informações, muitas vezes, e sensibilizar o gestor municipal e o gestor estadual (…) a gente precisa começar a desburocratizar”.

Além disso, é muito importante trazer o Conselho Regional de Farmácia para esse debate, porque os medicamentos especiais devem ser entregues nas Coordenadorias pelos farmacêuticos aos gestores ou secretários, e eles precisam ser capacitados e conhecedores do protocolo de refrigeração, pois, muitas vezes, quando o medicamento é transportado até municípios do interior, acaba-se desperdiçando dinheiro devido à falta de refrigeração adequada.

Leva-se muito tempo para chegar ao diagnóstico, devido à falta de educação sobre os principais sinais e sintomas da doença desde o início. Isso revela a importância de promovermos o II Fórum Melhor Jornada do Paciente com Doença Inflamatória Intestinal, para mostrar que o acesso ao diagnóstico e a participação de pessoas e profissionais preparados e capacitados, inclusive gestores, envolvidos na cadeia assistencial para o tratamento dessa doença, melhora a vida e a jornada dos pacientes com doença inflamatória intestinal. 

Para Gustavo (CEO e Founder da Educare) “esse Fórum também está acontecendo porque destes fóruns sempre surge alguma melhoria na jornada dessa gente, porque aqui estão as pessoas que têm algum poder de decisão e estão na assistência desse paciente, então a troca de experiência que surge nesses fóruns, as conexões que surgem sempre vão trazer melhoria na jornada do paciente”.

Ao final do evento, tivemos um debate com a plateia em que foram levantados temas como: a batalha dos médicos para oferecer o melhor tratamento aos pacientes, independente do custo, a necessidade de integração dos prontuários existentes nos diversos serviços de saúde, o desperdício dos recursos, a remuneração diferenciadas dos profissionais, e as metas e planos governamentais para combate das doenças inflamatórias intestinais na atenção especializada junto às Coordenadorias Regionais e Secretarias de Saúde do Estado e dos municípios.

Como um dos resultados do evento, tivemos o convite para a Dra. Marta apresentar seu trabalho como médica especialista e os principais gaps e necessidades no tratamento da doença inflamatória intestinal no SUS. A apresentação ocorrerá em uma reunião mensal da CIB (Comissão Intergestores Bipartite do Estado do RS), e contará com a presença do COSEMS/RS, a Secretária da Saúde do estado do RS, os Diretores das áreas temáticas e os Secretários da Saúde Municipais.

Elaborado por Gabriel Maciel, advogado e redator, e Luciana França, enfermeira e coordenadora de projetos (COREN/RS 163166).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Ministério da Saúde. Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT). Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/protocolos-clinicos-e-diretrizes-terapeuticas-pcdt. Acesso em: 22 jul. 2024.

INSTITUTO DE ESTUDOS DE SAÚDE SUPLEMENTAR – IESS. 28º VCMH – Variação dos Custos Médico-Hospitalares na Saúde Suplementar. Disponível em: https://iess.org.br/vcmh/28o-vcmhiess. Acesso em: 22 jul. 2024.

QUARESMA, Abel Botelho; CINTRA DAMIÃO, Aderson Omar Mourão; COY, Cláudio Saddy Rodrigues; MAGRO, Daniela Oliveira et al. Tendências temporais de incidência e prevalência das doenças inflamatórias intestinais no Sistema Único de Saúde do Brasil: um estudo populacional. In: Anais da 2a Semana Brasileira de Doença Inflamatória Intestinal, 2021, Campinas. Disponível em: https://proceedings.science/sebradii-2021/papers/tendencias-temporais-de-incidencia-e-prevalencia-das-doencas-inflamatorias-intestinais-no-sistema-unico-de-saude-do-br. Acesso em: 22 jul. 2024.