Generic selectors
Exact matches only
Search in title
Search in content
Post Type Selectors

Operadoras tradicionais se espelham em modelos propostos por healthtechs para buscar eficiência

Nos últimos anos, o mercado de saúde brasileiro ganhou diversas novas empresas que surgiram com a proposta de resolver dores do setor. Em um setor que era considerado relativamente atrasado no processo de transformação digital, essas startups chegaram justamente com operações apoiadas em tecnologia e foram ganhando espaço, forçando alguns players, como as operadoras tradicionais de planos de saúde, se movimentarem para não perder espaço.

Apesar de as empresas tradicionais serem consolidadas e terem grande parcela do mercado, as healthtechs apareceram com propostas diferentes, prometendo mais eficiência e cuidado mais humanizado. Dentre os principais diferenciais estão a adoção da atenção primária via telessaúde como porta de entrada do beneficiário, a coordenação do cuidado, uma maior análise dos dados de saúde e rede credenciada mais limitada, o que possibilita muitas vezes que haja uma redução no valor da mensalidade ao usuário final.

O Mapeamento HealthTech 2022, produzido pela Deloitte em parceria com a Associação Brasileira de Startups (Abstartups), aponta que 45% foram fundadas entre os anos de 2019 e 2021. No caso das healthtechs de planos de saúde, agora elas precisam mostrar seu valor frente à concorrência de um mercado que busca se adaptar às novidades trazidas por elas.

Aos planos de saúde tradicionais, a necessidade de adaptação não está apenas no risco de perder parte do mercado, ainda que de forma lenta e gradual. Com os custos de saúde elevados, terapias individualizadas cada vez mais caras e a pressão da sociedade por menores preços e maior disponibilidade de tratamento, surge a necessidade de buscar novos modelos que sejam economicamente eficientes – sem colocar em risco a saúde e o cuidado.

“Mudar isso não vai ser da noite para o dia, demora mais tempo. Mas uma semente já foi plantada e uma mudança já começou. As redes já estão ficando um pouco mais enxutas, as operadoras que já atuavam há 40 anos com um modelo de vender uma rede muito ampla já mudaram o modelo, porque o anterior não era eficiente. Os players antigos estão mudando esse modelo e os novos foram os que começaram esse processo”, analisa Marcos Novais, superintendente executivo da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge).

Operadoras tradicionais se movimentam

Já existiam iniciativas de operadoras que utilizavam a atenção primária, coordenação do cuidado, redes limitadas e uso da tecnologia antes mesmo das healthtechs. No entanto, o que elas fizeram foi ter esses pontos como carro-chefes de seus produtos, mostrando não só a viabilidade, como a possibilidade de utilizá-los como forma de tornar o setor mais eficiente.

A própria Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) vem incentivando ao longos dos anos a utilização desses serviços, e propõe certificados que estimulam as operadoras a adotarem novos modelos de negócios. Cinco Unimeds do país, por exemplo, foram acreditadas com a Certificação em Atenção Primária à Saúde entre 2021 e 2022.

“A questão é que é uma quebra cultural difícil. Quer dizer, por mais que a gente fale sobre a importância, se você vai na rua perguntar para as pessoas se elas querem isso, a maioria ainda vai dizer que não. Estão ganhando tração aos poucos, você está tendo cada vez mais modelos de atenção primária e coordenação do cuidado sendo implementados”, explica Novais, da Abramge.

O uso e a liberação da telemedicina tem colaborado com isso, já que facilitou que os beneficiários façam uma consulta sem sair de casa, o que poderia ser um impeditivo para a aceitação da atenção primária. A digitalização do setor como um todo colabora com isso: através de prontuário eletrônico e coleta de dados, é possível fazer uma análise das condições de saúde e riscos dos beneficiários, visando a uma integração e interoperabilidade.

Novais aponta que também há uma mudança de comportamento dos próprios beneficiários que ajudou as healthtechs. No passado, pessoas buscavam um plano de saúde que dessem segurança, e uma empresa com 30 ou 40 anos no mercado era considerado um sinal para isso. Agora, parte da população busca a inovação.

“Empresas antigas se adaptaram, mas ao mesmo tempo as healthtechs vão trazendo o tempo todo inovações, são empresas mais rápidas do que as operadoras tradicionais e colocam novos desafios para o mercado. As tradicionais estão se adaptando o tempo todo. As healthtechs estão se consolidando e vão continuar crescendo.”, analisa o superintendente executivo.

Do mesmo modo, os beneficiários buscavam uma rede ampla, que atendesse em território nacional, e oferecessem o máximo de especialistas e hospitais. Esse modelo tem se mostrado menos eficiente, já que a criação de parcerias com empresas estratégicas é capaz de ganhar escala e volume, sendo mais interessante para uma negociação e para concentrar as informações dos pacientes.

Novais aponta que um dos principais calcanhares de Aquiles das operadoras tradicionais para realizar mudanças nesse sentido são os contratos antigos, pois não é possível fazer uma alteração brusca no modelo, adotando por exemplo a atenção primária ou diminuindo a rede, o que via de regra provoca insatisfação aos beneficiários. Por isso, é preciso criar novos produtos do zero para entrar nessa concorrência e buscar eficiência, o que possibilita oferecer planos mais baratos.

Lançamento de linhas mais acessíveis

A Porto Saúde fez um movimento nesse sentido e lançou recentemente a Linha PRO, com preço 25% menor que outros produtos da operadora, voltada para pequenas e médias empresas de 3 a 99 funcionários, e foco no atendimento regionalizado. A estratégia quer somar novos beneficiários aos mais de 400 mil usuários da operadora.

“Trabalhamos diariamente para manter um bom relacionamento com parceiros ideais e estratégicos. Essa construção e conexão resulta em parcerias capazes de atender, cada vez mais, as necessidades de nossos clientes. Ao longo dos anos, pudemos observar alguns desafios enfrentados na hora de escolher um plano de saúde. Um dos fatores mais decisivos era a questão financeira”, explica Sami Foguel, CEO da vertical.

A linha oferece atendimento com médico da família e profissionais de enfermagem, em uma estratégia de atenção primária, mas não condiciona que os beneficiários passem por eles como ocorre em algumas healthtechs, o que pode por um lado ser uma forma de atrair novos beneficiários e incentivar uma mudança gradual de comportamento, sem precisar de uma ruptura mais brusca.

Entre os principais parceiros da Linha PRO estão o Hospital Sírio-Libanês e o Hospital Alemão Oswaldo Cruz, que fizeram parte da campanha de lançamento, mostrando a proximidade entre operadora e prestador, em uma estratégia que reforça o tom da parceria e do produto.

“O surgimento dessa nova categoria [healthtechs] no segmento da saúde provoca a necessidade de um olhar mais atento ao cliente, às novas tecnologias e às demandas de mercado. É preciso que as operadoras pensem diferente”, defende Sami, que afirma ainda que é natural que haja uma movimentação das operadoras tradicionais para o desenvolvimento de novos negócios.

A Amil é outra que lançou, em 2019, uma linha pensando em beneficiários com ticket médio menor: a Amil Fácil. Com a oferta de uma rede mais enxuta e atendimento regionalizado, utilizando serviços próprios da Amil Espaço Saúde e prestadores selecionados, ela oferece valores mais competitivos, a partir de 160 reais.

Antes de anunciar sua saída da Amil, o agora ex-CEO da Amil, Edvaldo Vieira, falou com Futuro da Saúde e disse acreditar que a entrada de novas empresas no mercado é importante para o desenvolvimento do setor, mas que a estrutura e sustentabilidade econômica das operadoras tradicionais são uma vantagem.

A experiência das healhtechs

O que Alice está fazendo não é fruto de genialidade nenhuma, é conhecido no mundo inteiro. O papel da atenção primária, da coordenação do cuidado, da remuneração dos provedores baseado em valor e a construção da tecnologia própria. Não acho que o que a gente está fazendo é novidade, o grande ponto é fazer”, explica Guilherme Azevedo, cofundador e chief health officer (CHO) da operadora.

Criada em 2019, a Alice conta hoje com mais de 11 mil beneficiários, sendo 78% da carteira composta por planos individuais ou familiares, modelo em escassez no mercado por ser considerado pouco flexível, já que as operadoras aplicam o reajuste com base no que foi autorizado pela ANS e não podem quebrar o contrato, apenas o beneficiário tem esse poder.

Questionado se percebe que o mercado está acompanhando e se adaptando às mudanças propostas pelas healthtechs, o cofundador afirma que existe uma transformação do conceito utilizado na saúde, mas que é um processo de consolidação que levará anos e os resultados irão surgir ao longo do caminho. Ter nascido digital, sem um legado de contratos e planos com modelos mais antigos, é um diferencial que contribuiu para a Alice seguir o que vem sendo proposto e de forma rápida.

Com atendimento baseado na atenção primária, que é considerado resolutivo em 85% dos casos e colabora com a redução de custos, a operadora busca não só uma melhor utilização dos recursos, mas também quer oferecer uma experiência diferente ao usuário. Todo atendimento e agendamento é feito através do aplicativo, que possui sistema integrado com os prestadores e a Alice. Essa integração permite que a empresa acompanhe todos os indicadores e observe as linhas de cuidados mais eficazes para cada condição.

“É uma visão de verticalização digital do sistema de saúde. A gente está dentro do hospital, os nossos sistemas interagem com os sistemas do hospital, cirurgiões da Alice que realizam as cirurgias e é o nosso corpo clínico que acompanha a retaguarda, o pós-cirúrgico e que faz o processo de alta”, explica Azevedo, que considera a operadora como semi-verticalizada, já que possui mais de 200 profissionais de saúde próprios que atuam juntos aos beneficiários.

Segundo ele, o preço da mensalidade da operadora está na faixa do que é praticado no mercado, mas afirma que o modelo proposto é único, e que é impossível comparar com outras ofertas. Já os modelos de remuneração aos prestadores utilizados são bem diferentes. O fee for service representa menos de 10% dos pagamentos, enquanto a remuneração baseada em valor passa dos 50%.

“Não adianta a gente falar que vamos crescer e ter 1 milhão de beneficiários. O setor de saúde não precisa disso. Se for para crescer você monta uma seguradora e cresce, porque isso é fazer mais do mesmo e não vai levar a gente para um resultado diferente, e a saúde precisa ir para um lugar diferente”, conclui.

Fonte:  https://futurodasaude.com.br/operadoras-tradicionais-healthtechs/