III Fórum Melhor Jornada do Paciente com Asma Grave: Entender a Jornada para Ampliar o Acesso
Paper Report produzido a partir do III Fórum Melhor Jornada do Paciente com Asma Grave
Motivada pelo sucesso das edições anteriores, em 18 de julho de 2024, no TECNOPUC em Porto Alegre, a Educare realizou o III Fórum Melhor Jornada do Paciente com Asma Grave, tendo como principais objetivos compreender o cenário do estado do Rio Grande do Sul em relação à doença e debater questões relevantes para melhorar o acesso e a jornada do paciente, tanto no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) quanto na saúde suplementar.
Dando continuidade a um dos principais projetos anuais da Educare, este fórum apresentou como um grande insight uma proposta gerada em 2023, a construção de um protocolo clínico para diagnosticar e tratar a asma grave, que foi apresentado durante o evento.
O encontro foi moderado pelo fundador da Educare, Gustavo Machado, e contou com o apoio da AstraZeneca, da SPTRS (Sociedade de Pneumologia e Tisiologia do Rio Grande do Sul), do SINDIHOSPA (Sindicato dos Hospitais e Clínicas de Porto Alegre), da ASBAG (Associação Brasileira de Asma Grave), da AMRIGS (Associação Médica do Rio Grande do Sul) e do TECNOPUC/Bio Hub da Saúde.
O III Fórum contou ainda com a presença de profissionais e representantes das principais instituições de referência para o diagnóstico e tratamento da asma grave no estado. Entre eles, representantes do IPE Saúde – RS, Unimed Porto Alegre, DGAE – SES/RS (Departamento de Gestão da Atenção Especializada da Secretaria Estadual de Saúde do Rio Grande do Sul), Grupo Hospitalar Conceição, Santa Casa de Porto Alegre, CRF/RS (Conselho Regional de Farmácia), Hospital Independência, Hospital Ernesto Dornelles, Ecco Salva, ASSOBRAFIR (Associação Brasileira de Fisioterapia Respiratória, Fisioterapia Cardiovascular e Fisioterapia em Terapia Intensiva), ImunoClin, Círculo Saúde e Casa dos Raros.
Para discutir o tema, foram convidados profissionais que, além de especialistas, se dedicam a melhorar a vida das pessoas com asma grave: Dra. Manuela Cavalcanti, pneumologista do Pavilhão Pereira Filho e Centro de Asma Grave da Santa Casa de Porto Alegre e Presidente da SPTRS; e Dr. Paulo Pitrez, pneumologista pediátrico da Santa Casa de Porto Alegre, membro do Comitê Científico da GINA (Global Initiative for Asthma) e Presidente do Grupo Brasileiro de Asma Grave (Grupo BraSA).
Qual o cenário da asma atualmente no Brasil e no mundo?
Asma é uma doença bastante prevalente e com alta morbimortalidade. Dados apontam que 20 milhões de brasileiros sofrem da doença, sendo 700 mil da forma grave. A incorporação e o início do uso dos medicamentos biológicos mudou a vida dos asmáticos graves, permitindo a remissão clínica em um quinto dos pacientes. No entanto, ainda há outras formas de melhorar o acesso aos tratamentos (Saúde, 2019).
O estudo “RESPIRA Project: Humanistic and economic burden of asthma in Brazil” demonstra que apenas 12% dos pacientes têm a doença bem controlada, o que permite afirmar que a esmagadora maioria dos asmáticos sofre demasiadamente com a doença. Adicionalmente, os pacientes asmáticos com frequência buscam atendimento de emergência, evoluindo até mesmo para parada cardiorrespiratória, precisando de internação em UTI (Carvalho-Pinto et al., 2020).
Quais as dificuldades enfrentadas para o adequado diagnóstico e tratamento da asma?
Quando não tratada adequadamente, a asma pode levar ao óbito: 7 brasileiros morrem por dia devido à doença. Em sua fala, o Dr. Paulo Pitrez destaca a importância da “capacitação dos centros e dos médicos, do entendimento sobre a gravidade da doença, sobre a tolerância de sintomas e hospitalizações, que é uma coisa muito enraizada na asma. A gente aceita o paciente doente com asma. O médico e o próprio paciente têm que ser mudados”.
A asma grave não tratada adequadamente resulta em prejuízos importantes na vida dos pacientes e na economia do sistema de saúde. Com o intuito de olhar para a sustentabilidade do sistema, foi proposto que as operadoras de saúde se aproximassem dos médicos especialistas e gestores familiarizados, a fim de implementar protocolos assistenciais, do diagnóstico ao tratamento, essenciais para atingir melhores índices de custo-efetividade no manejo dos pacientes.
A título de exemplo das dificuldades enfrentadas, podemos citar a utilização da espirometria, exame que mede a quantidade e a velocidade do ar que uma pessoa é capaz de inspirar ou expirar a cada respiração e que deveria ser obrigatório para o diagnóstico adequado de asma. No entanto, somente 60% dos pacientes em tratamento para asma têm acesso a esta avaliação, mesmo com a contribuição de parcerias público-privadas com a indústria farmacêutica.
Adicionalmente, dados mostram que metade dos pacientes que deveriam fazer uso regular e constante de medicação não o fazem, em razão da falta de disponibilidade dos medicamentos nos postos de saúde e do alto custo na rede particular. Outras dificuldades enfrentadas são a falta de acesso dos pacientes a médicos pneumologistas, pois, além da demora no encaminhamento, os profissionais estão concentrados em poucas regiões do país.
Sabe-se também que o acesso a medicamentos imunobiológicos para o tratamento desta patologia é diferente no sistema público e na saúde suplementar: o SUS incorporou, até este momento, somente o omalizumabe e o mepolizumabe, havendo muitas limitações de acesso ainda.
Como melhorar a jornada do paciente que sofre de asma no sistema de saúde?
É no posto de saúde que começa a jornada do paciente no SUS. A frequente e incorreta prescrição de vasodilatadores isolados (que inclusive aumentam a mortalidade da doença), bem como equívocos nas técnicas inalatórias para o correto uso das medicações demonstram a necessidade fundamental e prioritária de capacitar a equipe multiprofissional da atenção primária em saúde.
Segundo a Dra. Manuela Cavalcanti, que apresentou o cenário da doença no sistema de saúde público, “temos uma baixa taxa de prescrição de corticóide inalatório, um baixo conhecimento sobre o tratamento da doença e sobre qual seria o próximo passo daquele paciente que não está controlado”. Ela afirma que em muitas situações, o médico da atenção básica já poderia estar tratando o paciente em um quadro clínico controlado, encaminhando para o especialista, por exemplo, aquele paciente que de fato não responde mais aos tratamentos convencionais. Isto evitaria o uso excessivo de tratamentos prolongados com corticoide oral, que tem sido uma prática médica na atenção primária reconhecidamente inadequada.
Um bom exemplo de sucesso ocorreu em uma intervenção realizada em São Bernardo do Campo/SP: médicos pneumologistas foram convocados para fazer um treinamento durante uma semana dentro de um posto de saúde. Na semana seguinte, os pneumologistas passaram a atender os pacientes asmáticos junto com a equipe de médicos e enfermeiros. Assim, eles foram treinados na prática, com supervisão, sobre como atuar com esses pacientes. Na terceira semana, os médicos especialistas já não estavam presentes no posto, mas continuaram a prestar esclarecimentos de forma remota (Cançado et al., 2019).
Identificou-se uma redução significativa de erros sobre conceitos básicos da asma, e observou-se um aumento da prescrição de corticoides inalatórios, que é o tratamento básico adequado ao paciente com asma. Também houve uma menor taxa de encaminhamento – uma vez que os profissionais da atenção básica sabiam lidar com os casos –, e de internações, inclusive na época do inverno (Martins et al., 2016).
Gustavo, CEO da Educare, ressaltou a importância e o potencial das parcerias público-privadas para melhorar a jornada do paciente com asma grave. A exemplo disto, mencionou as ações do GHC que tem aplicado novas estratégias com esta visão para acelerar a cultura da inovação naquela instituição.
A farmacêutica e membro do Comitê Técnico de Saúde Pública do CRF/RS, Maracely Ataíde, contribuiu apontando a necessidade de valorizar o trabalho de prevenção, afirmando que não é preciso fazer com que o paciente asmático chegue a um estado grave da doença, tendo que ser internado, quando a situação poderia ser resolvida preventivamente e de forma simples, investindo na qualificação das equipes de APS e na educação do paciente.
Ainda que possam gerar um investimento inicial, logo essas medidas acarretarão em economia para o poder público, uma vez que o endereçamento da doença crônica poderá ocorrer antes dela atingir a sua forma grave, evitando assim internações e medicações de alto custo. A representante do CRF/RS também sugeriu uma aproximação com o COSEMS/RS a fim de sensibilizar gestores e secretários de saúde, permitindo que através do uso racional de medicamentos, a assistência farmacêutica contribua para a educação e orientação destes pacientes.
Como convidado para o evento, o Dr. Paulo Roberto da Silva, pneumologista com 40 anos de vivência na área, especialmente dedicados à educação de profissionais, reforçou sobre a importância de se trabalhar com dados, registros e números do que é feito nos serviços de atendimento de asma grave, lembrando das limitações de um processo educativo em uma consulta de 15 minutos. Como solução, propôs que houvesse um ambulatório paralelo, com regras independentes, mas intimamente ligado à atenção básica, a fim de oferecer uma assistência mais dedicada ao paciente com asma grave.
Apresentação dos Resultados do Projeto “Construção de Protocolos Clínicos de Diagnóstico e Tratamento para Asma Grave”
Como parte da programação e compromisso para este ano, o projeto “Construção de Protocolos Clínicos de Diagnóstico e Tratamento para Asma Grave” foi desenvolvido pela Dra. Manuela e Dr. Paulo, contando com a consultoria da Educare e apoio da AstraZeneca, sendo apresentado neste fórum para os convidados presentes.
A apresentação deste projeto, no formato de infográficos, teve como objetivo oferecer um modelo que permitisse às operadoras de saúde conhecerem seus números a fim de otimizar custos envolvidos com tratamentos para asma grave. O primeiro passo para identificar o paciente asmático é ter certeza sobre o diagnóstico, pois a asma pode facilmente ser confundida com outras condições, tais como DPOC (Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica), tuberculose, fibrose cística e bronquiectasia (Cançado et al., 2019).
Também é preciso identificar comorbidades que possam complicar o controle da asma: tabagismo, refluxo, rinossinusite crônica, apnéia do sono, entre outros. Após, deve-se avaliar os fatores modificáveis: a adesão ao tratamento, se as medicações estão sendo realmente utilizadas de forma adequada com a técnica inalatória correta, doses prescritas, avaliar o controle ambiental e a exposição laboral.
Identificado o paciente com asma grave, é preciso analisar se ele se enquadra nos critérios para uso dos medicamentos biológicos, e fazer a escolha correta do biológico a ser administrado.Em todas estas etapas, o protocolo clínico criado poderá auxiliar o profissional a tomar uma decisão mais assertiva para o paciente, sem excluir a avaliação da farmacoeconomia para o sistema.
O que podemos esperar nos próximos anos de inovações para o tratamento da asma grave?
O pneumologista Dr. Paulo indica que há perspectivas para o uso de medicamentos biológicos na forma inalável, e até mesmo para utilização via oral, o que irá dispensar a necessidade de o paciente comparecer a um centro de aplicação. Também há estudos consistentes em andamento para o desenvolvimento de micromoléculas com mais de um alvo. Por novas tecnologias, por incorporações menos demoradas para oferecer qualidade de vida a pacientes que precisam de tratamentos diferenciados , e por uma gestão baseada em equidade e sustentabilidade do sistema de saúde.
Elaborado por Gabriel Maciel, advogado e redator, e Luciana França, enfermeira e Gerente de Projetos (COREN/RS 163166).
Referências bibliográficas
Cançado, J. E. D.; Penha, M.; Gupta, S.; LI, V. W.; Julian, G. S.; Moreira, E. S. Respira project: Humanistic and economic burden of asthma in Brazil. Journal of Asthma, v. 56, n. 3, p. 244-251, 2019. DOI: 10.1080/02770903.2018.1445267.
Carvalho-Pinto, R. M.; Cançado, J. E. D.; Pizzichini, M. M. M.; Fiterman, J.; Rubin, A. S.; Cerci-Neto, A. et al. Recomendações para o manejo da asma da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia – 2020. Jornal Brasileiro de Pneumologia, v. 46, n. 1, p. e20190307, 2020.
Martins, S. M. et al. Implementation of ‘matrix support’ to reduce asthma and COPD referrals and improve primary care management in Brazil: a pilot observational study. NPJ Primary Care Respiratory Medicine, v. 26, p. 16047, 2016.
Saúde. A Asma na Visão e na Vida dos Brasileiros. Iniciativa da revista SAÚDE, da área de Inteligência de Mercado do Grupo Abril e da bio farmacêutica AstraZeneca, com o apoio da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (Asbai), da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT) e da Fundação ProAr. Maio de 2019. Disponível em: https://saude.abril.com.br/medicina/asma-e-um-problema-serio-mas-brasileiros-desconhecem-seus-riscos. Acesso em: 13 de agosto de 2024.